O desafio do empoderamento coletivo e a experiência do Momunes em Sorocaba
O Movimento das Mulheres Negras de Sorocaba (Momunes) surgiu em 1997, de um pequeno grupo de amigas, e se fortaleceu ao longo dos anos, como importante ferramenta de empoderamento. Foto: divulgação

O desafio do empoderamento coletivo e a experiência do Momunes em Sorocaba

“Uma sociedade igualitária não só oferece oportunidades iguais aos seus cidadãos e cidadãs, mas também se preocupa com condições de vida menos desiguais em sua população”

Por: Diana Oliveira

O Movimento das Mulheres Negras de Sorocaba (Momunes) surgiu em 1997, de um pequeno grupo de amigas, e se fortaleceu ao longo dos anos, como importante ferramenta de empoderamento. Foto: divulgação

Atualmente, muito se discute sobre a implantação de medidas de inclusão social em todo o Brasil. Afinal de contas, são milhares de pessoas que vivem à margem da nossa sociedade, completamente excluídas e ignoradas.

A inclusão social é o conjunto de medidas direcionadas a indivíduos excluídos do meio social, seja por alguma deficiência física ou mental, cor da pele, orientação sexual, gênero ou poder aquisitivo dentro da comunidade.

Dessa forma, o objetivo dessas ações é possibilitar que todos os cidadãos tenham oportunidades de acesso a bens e serviços, como saúde, educação, emprego, renda, lazer, cultura, entre outros.

Em setembro de 2015, foram criados pela ONU os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em uma reunião com os líderes mundiais e representantes da sociedade civil. Nesse encontro, eles elaboraram um plano de ação para proteger o planeta, erradicar a pobreza e garantir que as pessoas alcancem a paz.

São 17 objetivos, com 169 metas a serem atingidas até 2030, todos integrados e nos quais se equilibram as três dimensões do desenvolvimento sustentável: a ambiental, a social e a econômica.

Dentre os 17 ODS, o de número 10 tem o objetivo de reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles. O ODS 10 possui sete metas, e a meta 10.2 visa empoderar e promover a inclusão social, economia e política de todos, independentemente da idade, gênero, deficiência, raça, etnia, origem, religião e condição econômica.

Segundo o IDSC (Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades), Sorocaba (SP) ainda enfrenta grandes desafios para cumprir o ODS 10. Conforme a pesquisadora Dahra Araujo Almudi em “Tons do negro nas moradias urbanas periféricas” (UFSCar, 2020):

“Apesar de [Sorocaba] estar associada a um panorama de inovação e empreendedorismo, vê-se na prática cotidiana uma cidade com pensamento bastante provinciano, que exalta nomes de famílias tradicionais do município e apresenta população consideravelmente conservadora. Este paradoxo inovação x conservadorismo imprime no dia a dia um racismo brutal que se inculca na mentalidade do sorocabano, que reproduz o racismo, mas que nega fazê-lo.”

A proposta investigou a moradia/habitação urbana periférica através de variáveis que compõem as tipologias de Precariedade, Irregularidade e Carência/Vulnerabilidade sugeridas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) (2016. p. 48) para análises habitacionais.

Uma sociedade igualitária não só oferece oportunidades iguais aos seus cidadãos e cidadãs, mas também se preocupa com condições de vida menos desiguais em sua população. No caso brasileiro, a despeito de avanços na redução de desigualdades, permanece uma situação extrema, em que poucos detêm a maior parte dos recursos e das oportunidades – incluindo os recursos políticos que limitam e até mesmo impedem a mobilidade social.

Esta situação é injusta e danosa a toda sociedade. Ela joga contra direitos individuais e coletivos, e de populações vulneráveis. Ela prejudica a classe média e enfraquece nossa economia, nossa democracia, e é terreno fértil para o florescimento da violência.

Dessa forma, a inclusão social é importante pois combate a segregação social e viabiliza a democratização de diversos espaços e serviços para aqueles que não possuem acesso a eles.

Em 1948, com a Declaração dos Direitos Humanos, a liberdade e a igualdade entre as pessoas começou a ganhar espaço para debate e reflexão na contemporaneidade. Em decorrência disso, o debate acerca da inclusão social está cada vez mais relevante, fator que faz com que as pessoas sejam instigadas a abandonarem comportamentos excludentes e discriminatórios.

Em 1977, o psicólogo norte-americano Julian Rappaport cunhou o termo “empowerment” a partir da palavra “power” (“poder”) para defender que era preciso dar ferramentas a certos grupos oprimidos para que eles tivessem condições e autonomia de se desenvolver.

“Uma das contradições fundamentais do uso do termo ‘empoderamento’ se expressa no debate entre o empoderamento individual e o coletivo. Para os que usam o conceito na perspectiva individual, com ênfase nos processos cognitivos, o empoderamento se circunscreve ao sentido que os indivíduos se autoconferem. Tomam-no num sentido de domínio e controle individual, de controle pessoal. É ‘fazer as coisas por si mesmo’, ‘ter êxito sem a ajuda dos outros’. Esta é uma visão individualista, que chega a assinalar como prioritários os sujeitos independentes e autônomos com um sentido de domínio próprio, e desconhece as relações entre as estruturas de poder e as práticas da vida cotidiana de indivíduos e grupos, além de desconectar as pessoas do amplo contexto sócio-político, histórico, do solidário, do que representa a cooperação e o que significa preocupar-se com o outro.” (LEON, 2001, p.97).

O movimento feminista negro, por exemplo, trabalha para empoderar mulheres negras, promovendo conscientização, por meio de educação comunitária, palestras e produção de conteúdo. O objetivo é dar instrumentos necessários para que esse grupo reivindique políticas públicas que beneficiem ou diminuam suas dificuldades específicas.

Entre alguns projetos existentes na cidade, o projeto Momunes – Movimento das Mulheres Negras de Sorocaba, é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que nasceu da iniciativa individual da ativista social Mazé Lima, ao perceber a lacuna existente no município de Sorocaba, de uma organização social voltada para o protagonismo e empoderamento feminino que utilizasse como ferramenta uma educação afro-centrada.

Iniciou-se assim, em 13/05/1997, com um pequeno grupo de amigas, entoando músicas da cultura africana e em dialeto africanos, um coral, composto majoritariamente de mulheres negras, levando através da cultura, a África para os mais diversos ambientes da cidade e principalmente para as unidades escolares públicas e privadas.

Com a intensificação das atividades, deu-se origem ao Movimento de Mulheres Negras de Sorocaba. O Momunes, que em 1999 formaliza-se como Organização da Sociedade Civil e de utilidade pública, estende sua atuação para oficinas de geração de renda, oficinas de arte e cultura afro-brasileira, capacitações, seminários e a luta pela implantação e implementação da Lei 10.639/03, para a inclusão da obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira” nas escolas da educação básica do município.

Criou-se também o espaço “Casa de Acolhimento – Recomeçar”, em consonância com a Política Nacional da Assistência Social e dentro da Proteção Básica e Especial na promoção e fortalecimento de vínculos para a garantia de um abrigo provisório, onde as mulheres possam se fortalecer e buscar a conquista da sua autonomia moral, intelectual e material, possível retorno à família de origem ou até que tenham condições de autossustento e a garantia do exercício pleno da cidadania.

Em 2010, iniciaram a construção de sede própria e Espaço Comunitário Educacional do Momunes, onde será implantada uma creche para crianças em idade pré-escolar. E em 2019 estabeleceu-se, em gestão compartilhada com o Poder Público Municipal, a gestão administrativa e pedagógica de três unidades escolares na modalidade creche, para crianças de 4 meses a 5 anos, denominadas de Centro de Educação Infantil, bem como a gestão da Casa Lar São José, para crianças e adolescentes de 0 a 17 anos, em situação de vulnerabilidade.

O Projeto Momunes já atendeu mais de 500 mulheres e filhos em situação de vulnerabilidade e não somente mulheres negras: também atende cerca de 97 idosos.

Para colaborar com o Momunes, basta acessar a página do Movimento em http://www.momunes.org.br/ e clicar em “Como Ajudar!”.

*Diana Oliveira é terapeuta, professora de yoga, idealizadora da Casa Shakti e bacharelanda em Filosofia.

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